Ocupando um posto só preenchido por nove profissionais em 240 anos de história da Maison Veuve Clicquot, Dominique Demarville é a décima geração de Chef de Cave da marca – função responsável por garantir os fornecedores de uvas e por toda a produção. Em visita ao Brasil, para uma bateria de eventos nas cidades de São Paulo, Curitiba e Brasília, onde apresentou as novas safras dos champagnes Veuve Clicquot Vintage Blanc, Vintage Rosé e o La Grande Dame, aguardadas ansiosamente há anos pelo mercado. Veja entrevista de Demarville:
Por Shirley Legnani Fotos Divulgação
Como manter viva uma grife lendária como a Veuve Clicquot?
É uma boa pergunta. Para manter a marca viva são necessários dois pilares – a qualidade dos vinhos e a força do marketing. Juntos, esses pilares podem gerar tanto inovações como manter a qualidade enológica para que a marca possa seguir como uma lenda. A qualidade dos produtos da Veuve Clicquot é transmitida de geração em geração a cada Chef de Cave, tanto que antes de assumir esse cargo trabalhei durante três anos ao lado do antigo Chef, o que foi muito importante. Em relação ao marketing da marca, acho que ele começa pela identidade visual: a etiqueta amarela que simboliza a marca, e que é tão forte hoje, foi criada sem grandes intenções pela Madame Clicquot, que a usou para facilitar a fiscalização de suas caixas dentro dos navios na chegada aos portos e isso acabou sendo a grande força da marca. Aos poucos, as caixas que continham a etiqueta amarela Veuve Clicquot se tornaram sinônimo de produtos de qualidade.
Basta somente manter a qualidade secular ou é necessário ir ao encontro do gosto da nova geração?
A Veuve Clicquot sabe a importância que a marca tem e mantém a qualidade de seus champagnes, mas procuramos sempre por novas oportunidades e vamos ao encontro dos clientes. O gosto do nosso produto não vai mudar, mas os modos de consumo sim, tanto que estamos sempre de olho nas novidades, como uma ação que realizamos numa estação de esqui com o objetivo de se aproximar dos consumidores mais jovens ou nas festas Yelloween e pré Halloween que realizamos nas grandes cidades, com muita gente jovem e formadora de opinião. Queremos ser mais acessíveis para esses novos clientes, indo ao encontro deles de forma diferente.
Atualmente como está a produção da Maison, em termos de tecnologia, pesquisa, mercado?
A elaboração da Veuve Clicquot é baseada na tradição. Por isso até hoje compramos as uvas dos mesmos fornecedores de quem a Madame Clicquot comprava e, ao mesmo tempo, temos há dez anos um local de vinificação altamente tecnológico, com o que existe de mais moderno no mercado, tudo para termos o excelente equilíbrio entre acidez e doçura, fundamental para um excelente champagne. Mas temos enorme cuidado ao balancear tradição com tecnologia. A Veuve Clicquot é uma marca internacional, somos a segunda marca de champagne mais famosa no mundo e exportamos mais de 90% de toda nossa produção. Com muita alegria digo que o mercado brasileiro é muito importante para nós e os números de consumo aqui só vêm crescendo. Fico feliz, pois existe uma paixão dos brasileiros pela marca que vejo crescer a cada vinda minha ao Brasil.
O que a Veuve Clicquot tem de diferente em relação aos outros champagnes?
O toque Veuve Clicquot! o estilo dos nossos champagnes é baseado na uva Pinot noir, somos a Maison que mais se utiliza dessa casta e é com ela que conseguimos manter o frescor da bebida e uma complexidade única, tanto no paladar como no aroma. Mais de 50% da assemblagem é composta por Pinot noir e isso é feito desde a primeira produção da Maison. Temos arquivos das receitas e das anotações feitas pela própria Madame sobre as porcentagens e as assemblagens utilizadas, até mesmo da quantidade de uvas compradas na época. uma verdadeira joia para os 240 anos de história da marca.
O senhor conhece os espumantes brasileiros?
Sim, claro que conheço. Provei os da Chandon, conheço pessoalmente o Philippe Mével (enólogo francês responsável pela produção da Chandon Brasil) e fiquei muito impressionado com a qualidade do espumante. O mercado de espumante é gigantesco, são cerca de três bilhões de garrafas ao ano, sendo que o champagne representa 10% desse total. ou seja, o consumidor de espumante é muito importante para nós, pois ele um dia irá migrar para o champagne, e é muito importante que um espumante não seja uma cópia do champagne. Acho que a Chandon faz bem seu papel, pois ela mantém uma identidade.
Quais as novidades da marca este ano?
Temos grandes novidades que, aliás, foi o que me trouxe para o Brasil, onde lançamos a safra de 2004 do Veuve Clicquot Vintage rosé, Vintage Blanc e do Veuve Clicquot La Grande Dame. A safra de 2004 desses vinhos é de altíssima qualidade, pela leveza e grande potencial de envelhecimento. A La Grande Dame foi lançada pela última vez em 1998, ou seja, é um vinho excepcional e de produção limitada, pois corresponde a apenas 1% de toda a produção da Maison.
E nos anos que as safras não são boas…
Normalmente março não é quente na região de Champagne, mas este ano foi, e as uvas começaram a crescer muito, não tendo a acidez necessária. Já tivemos uma perda de 10% em toda a produção. Nos anos em que as safras não são boas, usamos os vinhos de guarda que preservamos em nossa grande coleção, ou seja, guardamos uma porcentagem de vinhos das safras boas para utilizarmos quando for necessário. são 17 anos de vinhos de reserva, sendo o mais antigo de 1988. Com exceção de certos anos em que não temos bons vinhos para guardar, como foi o caso de 2003, no qual as uvas estavam muito maduras – e para a produção de champagne é extremamente importante o balanço entre acidez e açúcar. Com os vinhos de guarda podemos equilibrar a produção.
Então a natureza tem um papel fundamental na produção?
Meu primeiro chefe é a natureza e é muito importante proteger o terroir. Na Maison temos um trabalho muito importante de preservação e de sustentabilidade, desde o material da plastificação das embalagens até o tamanho das garrafas, que hoje são menores. Reformamos há pouco o Hotel du Marc (casarão neoclássico do século 19 conhecido como a casa da Veuve Clicquot Ponsardin, localizada em Reims e hoje usado par a recepcionar os viajantes “endinheirados” e apaixonados por vinhos). Uma parte dessa renovação foi a energia solar, redução de 10% no consumo de água e a instalação de uma tecncologia que faz com que o ar fresco das caves se espalhe por todos os outros ambientes. Antes de vir para cá, pesquisei sobre a cidade de Curitiba, que eu até então não conhecia, e fiquei impressionado com a preocupação da cidade com a sustentabilidade.
O que o senhor fazia antes de trabalhar na Veuve Clicquot?
Eu estudava sobre como fazer vinhos em Borgonha, Bordeaux e Alsácia, mas depois larguei minhas malas na Maison. Isso foi em 1991 e estou até hoje. Em média, cada Chef de Cave fica 24 anos no cargo e eu estou há três anos, então tenho bastante tempo pela frente, e daqui a alguns anos começarei a olhar para alguém que possa me suceder, mas espero que ainda demore muito. Meu trabalho exige tempo, dedicação e calma, igual a tudo que se exige para o melhor amadurecimento das uvas e, consequentemente, para a produção de bons vinhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário